quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

O luto amoroso



Não é prosa nem poesia, as chamas não ardem, o mundo transforma-se em névoa cinza, qualquer comida lhe dá azia, o sono nunca vem, o relógio faz o tic-tac dos filmes, a cabeça dói, não há fome, só um constante buraco que suga.
As pessoas falam e suas bocas se movem em câmera lenta, não existe som, não há linguagem, todos são meros coadjuvantes de um espetáculo trágico onde o protagonista é você.
Tic-tac, tic-tac, tic-tac, as horas não passam, é como se o tempo parasse para lhe dar os pêsames, a noite torna-se eterna, a cama fria, o quarto denso, você adormece para logo em seguida acordar aos gritos, os pesadelos são realistas, são seguidos, repetitivos, seguem dias e dias, intermináveis dias. 
Toda e qualquer capacidade de concentração desaparece, não se pode ler; as palavras borram, os filmes são uma viagem alucinante para dentro da tela, mas não faz sentido algum, é como estar vidrado em uma eterna sensação de não pertencer.
Não há refúgio, não há sol que lhe aqueça, nem rota que lhe salve, não há nada que lhe pertença, não neste momento, suas necessidades desaparecem, nada lhe incomoda; a dor de dente, o mau hálito, a comida estragada, a roupa mofada, o relatório não feito, a conta atrasada, a toalha na cama... 
Tic-tac, tic-tac, é uma viagem rumo a um planeta distante, é nadar em mar aberto sem terra a vista depois que uma embarcação afunda, tão aterrorizante que anestesia. 
Porém, é universal, é só um luto, um dia passa, e todos sabem e você sabe, um dia... 
Tic-tac, tic-tac, falta muito para amanhecer?

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